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HIV: Porquê tão perigoso?

13 Ago 2018 - 15h04 - 4.803 caracteres

O vírus da SIDA (HIV) destaca-se como uma das maiores ameaças à saúde mundial com um número de infetados superior a 70 milhões e com mais de 30 milhões de mortes registadas. O HIV é um lentivírus (família Retroviridae) com um tropismo especial para as células do sistema imunitário, responsáveis pela defesa do organismo humano, em especial, as células que contém na sua superfície o recetor CD4. Como consequência, os indivíduos afetados têm uma elevada taxa de infeções e de tumores explicada pela deficiência imunitária que os caracteriza após contraírem a infeção. De que forma é que a infeção por este vírus se torna tão perigosa e porquê que o seu tratamento é tão difícil?

 

Primeiro deve salientar-se a rapidez com que o vírus estabelece uma infeção latente. Sendo um retrovírus, a sua informação genética encontra-se na forma de RNA, uma molécula semelhante ao DNA mas que necessita de ser convertida nesta para ser integrada no DNA da célula. Todo este processo de conversão e integração da informação do vírus nas células humanas ocorre entre 5 a 10 dias. Tendo em conta que a ativação do sistema imunitário adaptativo demora, em média, uma semana, quando as nossas defesas específicas estão aptas a combater o vírus da SIDA, já este pode ter ‘instalado’ um reservatório silencioso nas células.

O processo de conversão RNA-DNA referido constitui uma das outras armas do vírus na luta contra o nosso sistema imunitário. A reação é mediada por uma proteína da classe das enzimas que tem uma altíssima taxa de mutação, ou seja, a enzima altera o vírus no processo de conversão. Deste modo o vírus que é inserido no DNA nas células humana é uma forma diferente do vírus que inicialmente entrou na célula. Regista-se então uma ‘impotência’ do organismo para se defender contra o vírus, porque as moléculas criadas para essa defesa estarão preparadas para combater a primeira versão do vírus que entrou na célula. 

O desenvolvimento de vacinas eficazes torna-se um autêntico desafio para um vírus com uma taxa de mutações tão elevada; como é possível preparar o organismo para uma infeção causada por um agente que se altera tão frequentemente?

Outro fator depreende-se com as próprias células que o vírus infecta. A condição essencial para que o HIV entre nas células é a presença da molécula CD4 à superfície das mesmas.  Várias células do sistema imunitário, os linfócitos T helper, os macrófagos ou as células dendríticas enquadrando-se nessa descrição, logo, as mesmas células que têm como função atacar invasores são as que são infetadas e danificadas pelo vírus!

Salienta-se ainda que existe a possibilidade de as partículas virais se anexarem às células dendríticas, um dos componentes do sistema imunitário, e serem transportadas por estas para os nódulos linfáticos, onde, por sua vez, existe uma grande concentração de células com o recetor CD4 à superfície facilmente alcançáveis pelo vírus. Por este e ainda outros procedimentos semelhantes, os nódulos linfáticos podem-se tornar incontestáveis reservatórios de HIV.

Existem alguns tratamentos bastante dispendiosos que têm tido sucesso em atrasar o desenvolvimento da doença. Todavia, ainda falta um longo caminho na procura por uma solução permanente. Apenas 25% da população europeia consegue impedir que as manifestações da doença interfiram com o seu dia-a-dia. A rapidez com que estabelece a latência, a elevada taxa de mutações, a debilidade do sistema imunitário e o uso deste para facilitar a sua propagação pelo organismo fazem do HIV um dos mais complexos desafios da ciência atual.

Fonte: ‘How The Immune System Works’, Lauren Sompayrac

 

Leonardo Fernandes


© 2018 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva


Leonardo Fernandes

Tem 20 anos e é natural de Vila Real. Concluiu o ensino secundário na Escola Secundária Morgado Mateus. Aluno do Mestrado Integrado de Medicina na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.

Links: https://metionina.blogspot.pt/

           https://medium.com/@leoffp10


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