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O que sabemos sobre o bosão de Higgs

02 Jul 2012 - 17h47 - 4.531 caracteres

No passado dia 13 de Dezembro de 2011 a Organização Europeia de Física Nuclear, CERN, anunciou os resultados mais recentes da pesquisa do bosão de Higgs no LHC, o maior acelerador de partículas do mundo. Muito se tem falado e especulado sobre este tema da Física de Partículas, a que se dedicam também diversos investigadores portugueses, vários deles integrando o Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas.

O Modelo Padrão da Física de Partículas, que foi formulado e desenvolvido teoricamente ao longo da década de 60 do século passado, tem tido um grande sucesso com a sua descrição dos dados disponíveis a ela relativos. Entre outros fenómenos, o Modelo Padrão previu a existência das partículas mediadoras das forças eletrofraca e forte, cuja existência foi já demonstrada experimentalmente, bem como da partícula de Higgs. Apesar disso, um dos seus componentes fundamentais, o bosão de Higgs, não foi ainda descoberto. Isto é, pode-se afirmar que os físicos têm um modelo teórico que descreve com uma precisão incrível o que se conhece, mas as bases desse modelo estão por provar. Há também a convicção que a formulação do Modelo Padrão possa ser incompleta e que na realidade seja válido apenas nas energias acessíveis presentemente, à semelhança do que aconteceu, por exemplo, com a descrição dos movimentos dos corpos pela Mecânica Newtoniana. A Supersimetria ou as Teorias de Cordas são exemplos de formulações mais gerais que o Modelo Padrão.

Esta pesquisa mais recente do bosão de Higgs foi feita analisando cerca de seiscentos biliões (6×10¹⁴) de colisões de pares de protões registadas pelos detetores ATLAS e CMS. Os protões, que são partículas subatómicas, são acelerados pelo LHC e quando colidem têm uma energia igual a três biliões e meio de eletrões-volt (3,5 TeV). Um eletrão-volt corresponde à energia fornecida a um eletrão quando este atravessa uma diferença de potencial igual a um volt, e equivale aproximadamente a 1,6×10⁻¹⁹ J (em que J representa um joule). Analisar esta quantidade impressionante de colisões requer o uso de sistemas computacionais avançados.

De acordo com o Modelo Padrão, o bosão de Higgs decai para pares de outras partículas já conhecidas, como por exemplo pares de fotões, de quarks b, de bosões Z ou de bosões W, entre outras possibilidades. Alguns destes pares de partículas são mais fáceis de procurar entre os biliões de colisões do que outros. Como o Modelo Padrão também prevê que o número de vezes que o bosão de Higgs decai para cada par de partículas depende da sua massa, então a sua pesquisa também será mais fácil ou difícil consoante a sua massa. Por estranho que pareça é precisamente na chamada região de baixa massa, entre os 100 GeV e os 130 GeV, que é mais complexa a procura do bosão de Higgs. Pesquisando cinco dos decaimentos possíveis mais promissores, os investigadores das colaborações ATLAS e CMS, compararam para cada hipótese de massa do bosão de Higgs os dados obtidos com as previsões do Modelo Padrão. Para as hipóteses de massa inferior a 116 GeV ou compreendida entre os 127 GeV e os 600 GeV, concluem com um nível de confiança igual a 95% que o bosão de Higgs não existe. Para o intervalo de massas entre os 116 GeV e os 127 GeV não é possível nem excluir o bosão Higgs, nem confirmar a sua existência. Isto deve-se ao facto de o número de acontecimentos previstos pelo Modelo Padrão ser semelhante às flutuações estatísticas dos dados analisados. Actualmente, considera-se uma descoberta quando o número de acontecimentos observados em excesso é superior a 5 vezes o erro estatístico, o que corresponde a uma probabilidade de 0,000057% de não se tratar, de facto, de uma descoberta. Na região do intervalo de massas que não foi excluído, observa-se um excesso de dados para a hipótese de massas à volta de 125 GeV. Este excesso é observado por ambas as colaborações (ATLAS e CMS) e em vários canais de decaimento, mas não é suficiente para se poder afirmar que este excesso é devido à existência do bosão de Higgs. ATLAS mede um excesso equivalente a 2,3 vezes o erro experimental, enquanto que CMS observa um excesso de 1,9 vezes o erro experimental. No próximo ano o LHC irá colidir quatro vezes mais protões do que até ao presente.

Com este aumento de estatística vai ser possível saber se os dados agora divulgados são a primeira indicação da existência do bosão de Higgs ou se são apenas flutuações estatísticas e, afinal, ele não existe.

Falta pouco para sabermos se Peter Higgs irá ser galardoado com o prémio Nobel da Física.

 

Filipe Veloso

(Laboratório de Instrumentação e Física Experimental de Partículas)

 

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