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Dinossauros: velhos mitos (2)

15 Out 2011 - 13h31 - 2.795 caracteres

A primeira vez que um dinossauro fez a sua estreia no mundo do cinema ocorreu muito antes de Spielberg ter estreado Parque Jurássico, em 1993. Um dos primeiros filmes de animação tinha como principal intérprete um dinossauro, de cauda e pescoço compridos, que se chamava Gertie. Este dinossauro saurópode desfilou nos ecrãs a preto-e-branco pela mão de Winsor McCay, em 1914, sendo esta a estreia dos dinossauros no mundo do cinema. “The Valley of Gwangi” (1969) ou “When Dinosaurs Ruled the Earth” (1970), são dois exemplos em que se pode verificar tanto a sincronia existencial de homens e dinossauros, como, sobretudo, a ruptura da estabilidade social que o dinossauro vem trazer. Se na cinematografia ocidental o dinossauro é representado de forma fiel, a cultura cinematográfica oriental, nomeadamente a japonesa, altera a anatomia do dinossauro, transformando-o numa entidade diferente. Um monstro pós-nuclear é criado e vem destruir cidades e culturas. Vários autores apontam que o monstro, Godzilla, não é mais do que um fenómeno catártico colectivo da sociedade japonesa às explosões de Hiroshima e Nagasaki. A morfologia do dinossauro é alterada, quase como um efeito de mutação de origem nuclear.

O dinossauro desempenha assim, pelo menos no ocidente, um papel que era tradicionalmente representado pelo dragão, monstro que encarnava todo o tipo de mal nas culturas judaico-cristãs. A actualização iconográfica, com a substituição do dragão pelo dinossauro, não é consensual para a maioria dos investigadores, embora seja sem dúvida apelativa, encontrando-se facilmente inúmeros exemplos deste fenómeno.

A influência dos dinossauros na literatura surgiu pela mão de Arthur Conan Doyle, o criador de Sherlock Holmes. A descoberta de uma pegada de Iguanodon fossilizada, em 1909, impressionou de tal forma Conan Doyle que o inspirou na criação de um mundo fantástico, cheio de criaturas extintas e gigantescas, na América do Sul, no seu livro de 1912 “ O Mundo Perdido”.

“O político X é um dinossauro”, já todos lemos por mais do que uma vez. Este baptismo pejorativo, na maioria dos casos, pretende sublinhar o carácter ultrapassado e decadente do nomeado. Há, assim, a associação do termo dinossauro a todo o tipo de pessoas e realidades que há muito deveriam estar reformadas ou apenas desaparecidas. Incorpora-se a realidade da extinção biológica na dimensão humana, conotando-se o dinossauro com o arcaico e ultrapassado humano. Os dinossauros diversificaram-se e sobreviveram durante quase 200 milhões de anos, mas a sobranceria de um grupo de mamíferos que escreve há poucos milhares de anos, para além de biologicamente embaraçosa, é injusta. O ser humano apenas caminha sobre a Terra há uma pequena fracção do tempo em que os dinossauros percorreram todos os ambientes terrestres.


© 2011 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva


Luís Azevedo Rodrigues

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