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A Lua no horizonte é realmente maior?

18 Jun 2014 - 16h35 - 5.361 caracteres

Diz-se que a Lua junto ao horizonte parece maior do que quando a vemos mais alta. Todos nos apercebemos disso. Mas é realidade, ilusão ou pura confusão? Vamos desfazer o mito!

 

A distância média da Terra à Lua, entre os centros destes dois astros, é de cerca de 384 400 km. No entanto, a órbita lunar em torno da Terra tem a forma de uma elipse, descrita em cerca de 27,3 dias, pelo que a distância Terra-Lua não é constante: varia entre cerca de 363 299 km (perigeu), em que a Lua parece maior, até 405 507 km (apogeu), onde é vista com menor diâmetro aparente. Isso é real e pode medir-se, mas aqui o nosso objectivo é outro: como se explica a diferente percepção visual do diâmetro aparente da Lua, na mesma noite, a diferentes alturas em relação ao horizonte?

Desde que a Lua nasce até ao momento em que atinge a sua altura máxima na mesma noite, passam pouco mais de cinco horas. Por isso, a distância Terra-Lua pouco varia num intervalo de tempo tão curto e podemos considerar, praticamente, essa distância como constante. É a rotação da Terra que nos dá a ilusão se a Lua se mover no céu durante essas poucas horas. 

Podem adiantar-se muitas tentativas para justificar a percepção de uma Lua maior junto ao horizonte, a nascente ou a poente: maior proximidade, dizem alguns; pura ilusão, afirmam outros; percepção errónea, para outros ainda. Qual será a explicação para isto?

A Figura 1 mostra como varia a distância da Lua em relação a um observador terrestre, desde que ela nasce até à sua altura máxima. É a Terra que roda, mas o observador, sentindo-se parado, tem a ilusão de que a Lua sobe no céu (movimento aparente). Mostram-se três posições da Lua em relação ao observador: no horizonte (H), à distância dH; a 45º de altura, à distância d45; no zénite (Z), à distância dZ, situação impossível para a latitude do território português, onde a Lua não excede 76º acima do horizonte. Por razões de clareza, a distância da Terra à Lua não foi representada à escala, mas as dimensões relativas da Terra e da Lua estão na mesma escala.

Podemos ver que dH é maior do que dZ, por um excesso igual ao raio terrestre (6378 km); junto ao horizonte, a Lua está 1,6% mais longe do observador do que quando se encontra no zénite (se isso for possível para esse observador). E a 45º de altura está mais longe do que no zénite e mais perto do que quando a vemos no horizonte (a 45º, a Lua está, contas feitas, a menos 71% do raio terrestre do que se estivesse no horizonte: diferença FC). Mas se a Lua no horizonte está na realidade mais longe do observador do que quando aparece mais alta, como é que todos juramos vê-la maior? Uma distância maior deverá corresponder a um diâmetro aparente menor (e vice-versa). Portanto, o diâmetro aparente da Lua é máximo no zénite, um pouco menor a 45º de altura e ainda menor no horizonte. Trata-se de um resultado surpreendente, contrário ao senso comum: a Lua junto ao horizonte apresenta de facto um diâmetro aparente menor (menos 1,2% do que em d45). Porque razão nos parece maior? O efeito de vizinhança, e os pormenores da paisagem muito mais próximos do que a Lua, contribuem para essa distorção de percepção (Fig. 2). Mas podemos desfazer facilmente essa distorção perceptiva.

Faça o Leitor a seguinte experiência simples, numa noite de Lua-cheia já muito elevada sobre o horizonte. Utilize um pedaço de vidro vulgar, colocado em frente dos olhos para ver a paisagem através do vidro e, ao mesmo tempo, reflectir a imagem da Lua como se ela estivesse junto ao horizonte (Figura 2 (b)). Verá imediatamente que a Lua lhe parece muito maior. E pode fazer o inverso: de costas para a Lua cheia muito junta ao horizonte, faça, por reflexão, com que ela pareça estar a grande altura: vai parecer-lhe menor!

Veja o artigo mais desenvolvido em http://apaa.co.pt/Rev43/revista_43_FINAL.pdf  (págs. 16-20).

 

Texto, fotografia e infografias de Guilherme de Almeida

 

 

Legendas das Figuras

 

Figura 1. A Lua no horizonte, a 45º de altura e no zénite, para um observador em O. R indica a medida do raio terrestre médio.

Figura 2. O efeito de vizinhança (a) distorce a nossa percepção do diâmetro do círculo laranja, sempre do mesmo tamanho, que parece maior quando rodeado de círculos menores. Com um vidro transparente podemos ver em simultâneo (b) a paisagem através do vidro e colocar virtualmente a Lua junto ao horizonte, entre árvores ou "a nascer" entre prédios: ela vai parecer muito maior!


© 2014 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva


Guilherme de Almeida

Guilherme de Almeida (n. 1950) é licenciado em Física pela Faculdade de Ciências de Lisboa e foi professor desta disciplina, tendo incluído Astronomia na sua formação universitária. Proferiu mais de 80 de palestras sobre Astronomia, observações astronómicas e Física, publicou mais de 90 artigos e é formador certificado nestas matérias. Utiliza telescópios mas defende a primazia do conhecimento do céu a olho nu antes da utilização de instrumentos de observação. É autor de oito livros sobre Astronomia, observações astronómicas e Física. Algumas das suas obras também estão publicadas em inglês, castelhano e catalão. Mais informação em  http://www.wook.pt/authors/detail/id/5235 


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