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Há dez anos a caminho de um cometa

25 Jul 2014 - 15h55 - 4.583 caracteres

Há cerca de dez anos, mais precisamente a 2 de Março de 2004, um foguetão Ariane-5 lançou no espaço a sonda europeia Roseta. O objetivo científico desta missão é o de estudar em detalhe o cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko e contribuir para o nosso conhecimento da formação do sistema solar.

O cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko foi descoberto em 1969 quando Klim Churyumov examinava fotos de regiões do espaço feitas Svetlana Gerasimenko. Precebe-se assim o nome deste astro. Depois disso este cometa foi confirmado e observado várias vezes por astrónomos aquando da sua aproximação à Terra e ao Sol. Sabe-se que tem actualmente um período orbital de 6,45 anos.

Depois de uma década de peregrinação espacial de aproximação a um momento da órbita do cometa em torno do Sol, a sonda Roseta encontra-se agora a menos de cinco mil quilómetros do cometa. Esta aproximação já permitiu que a sonda conseguisse fotografar o perfil do cometa. Há poucos dias, a Agência Europeia Espacial (ESA, sigla em inglês) divulgou imagens (http://www.esa.int/spaceinimages/Images/2014/07/Rotating_view_of_comet_on_14_July_2014) cada vez mais detalhadas do cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko, como aquela que ao lado se publica.

As imagens captadas mostram um cometa com uma forma irregular e há quem diga que faz lembrar um pato de borracha. De facto a foto mostra um pedaço mais alongado que faz lembrar uma cabeça sobre um outro pedaço maior e arredondado que seria o corpo.

O reconhecimento da forma intrigante do cometa é importante para os cientistas que comandam a missão. Recorde-se que a sonda Roseta transporta consigo um pequeno módulo, o File (com 100 quilos), que será largado em Novembro deste ano para poisar sobre a superfície do cometa. “Teremos de fazer uma análise e uma modelação do formato do cometa, para determinar a melhor forma de voarmos à volta de um corpo com uma forma tão única, tendo em conta o controlo do voo e a astrodinâmica, as necessidades científicas da missão e os elementos relacionados com a aterragem, como a análise do local e a visibilidade entre o módulo de aterragem e a sonda”, explicou num comunicado da ESA Fred Jansen, o chefe da missão da Roseta.

Esta missão espacial está rodeada de muita espectativa, uma vez que será a primeira vez que será colocado equipamento científico na superfície de um cometa para o estudar. Os cometas possuem poeiras cósmicas e estão recobertos com gelo primordial. São relíquias representativas da constituição do nosso sistema solar, testemunhos congelados da sua formação.

Assim, a análise do cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko poderá fornecer pistas sobre a composição inicial do sistema solar e informações sobre a formação dos planetas, como a Terra. Refira-se que os cientistas têm indicações que muita da água e alguns compostos orgânicos que originaram a vida na Terra poderão ter vindo de cometas semelhantes a este, que agora se estuda, e que bombardearam o nosso planeta no início da sua formação. O seu estudo pode trazer novos dados que confrontarão essas hipóteses. Para além disto, esta é uma oportunidade única para se investigar a própria formação destes corpos errantes do nosso sistema solar.

Recorde-se que o nome desta sonda, Roseta, é uma referência à pedra com o mesmo nome que foi descoberta em 1799 e permitiu ao arqueólogo francês Jean-François Champollion decifrar os hieróglifos egípcios. Assim, o nome com que foi baptizada esta missão espacial representa o espírito científico de exploração e de decifração da informação que nos permitirá melhor reconstituir os momentos primordiais da formação do nosso lar cósmico e que levaram, por último, à evolução da nossa espécie, da inteligência que compreende e se maravilha com o Cosmos.

 

António Piedade


© 2014 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva


António Piedade

António Piedade é Bioquímico e Comunicador de Ciência. Publicou mais 700 artigos e crónicas de divulgação científica na imprensa portuguesa e 20 artigos em revistas científicas internacionais. É autor de nove livros de divulgação de ciência: "Íris Científica" (Mar da Palavra, 2005 - Plano Nacional de Leitura),"Caminhos de Ciência" com prefácio de Carlos Fiolhais (Imprensa Universidade de Coimbra, 2011), "Silêncio Prodigioso" (Ed. autor, 2012), "Íris Científica 2" (Ed. autor, 2014), "Diálogos com Ciência" (Ed. autor, 2015) prefaciado por Carlos Fiolhais, "Íris Científica 3" (Ed. autor, 2016), "Íris Científica 4" (Ed. autor, 2017), "Íris Científica 5" (Ed. autor) prefaciado por Carlos Fiolhais, "Diálogos com Ciência" (Ed. Trinta por um Linha, 2019 - Plano Nacional de Leitura) prefaciado por Carlos Fiolhais. Organiza regularmente ciclos de palestras de divulgação científica, entre os quais, o já muito popular "Ciência às Seis". Profere regularmente palestras de divulgação científica em escolas e outras instituições.


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