Registo | Contactos

ADN do metro de Nova Iorque

02 Mar 2015 - 10h30 - 3.998 caracteres

Qual o lugar do mundo onde há centenas de espécies de bactérias, incluindo peste e anthrax, resíduos de humanos de origens ancestrais em África, Europa, Ásia e Américas, restos de pizza e hamburgers, e até provas de inundação de furacões devastadores? A resposta certa é: o metro de Nova Iorque. Foi aquilo que o Pathomap (www.pathomap.org/), um projeto liderado por Chris Mason do Weill Cornell Medical College em Nova York, descobriu.

O método utilizado envolveu a análise do ADN que se encontra nas várias estações do metro. Para obter o ADN usaram-se cotonetes, que os cientistas esfregaram nas várias superfícies do metro. O que até mereceu encorajamento de alguns passageiros satisfeitos por o metro estar a ser tão bem limpo! O ADN foi sequenciado e comparado com bases de dados de todos os organismos dos quais se conhece já a sequência. Cada organismo tem sequências únicas, e quando algum do ADN encontrado coincide com o da base de dados podemos concluir pela presença de uma determina espécie na estação. Esta análise é efetuada por algoritmos que comparam a mistura de sequências do ADN extraído com todos os organismos já disponíveis. E, como sempre em ciência, trabalhos anteriores são fundamentais: uma das falhas surpreendentes é a ausência de ADN de barata, um animal particularmente presente e visível no metro. Esta ausência é facilmente explicada porque as bases de dados atuais não incluem a barata. As falhas nas bases de dados atuais explicam a não identificação de 50% das sequências de ADN encontradas no metro.

O ADN dos vários milhões de humanos que passam no metro foi identificado. E foi possível analisar qual a origem ancestral do conjunto das pessoas que passam em cada estação (esta foi a parte em que eu estive mais diretamente envolvido). Embora globalmente não haja diferenças no ADN entre os humanos, as pequenas diferenças possibilitam indicar a ancestralidade de cada um de nós. Em várias estações a ancestralidade obtida pelo ADN corresponde ao que se conhece da população de Nova Iorque; por exemplo, numa estação próxima de Chinatown, as amostras humanas indicavam uma predominância asiática.

A presença de patogéneos causadores de doenças graves como peste e anthrax é surpreendente. Muito há a investigar sobre este assunto, mas claramente não afeta os habitantes da grande cidade, uma vez que que não há casos de recentes em Nova Iorque dessas doenças. Uma conclusão que nem é novidade: vivemos sempre rodeados de muitas bactérias e convivemos bem com isso. Na realidade, o problema seria se tivéssemos encontrado no metro um ambiente estéril e sem vida bacteriana...

Benefícios deste estudo incluem saber mais (sempre um motivo fundamental de um estudo científico) e saber qual o perfil dos micróbios do metro de Nova Iorque (microbioma). Alterações ao microbioma normal podem indicar problemas graves como uma epidemia ou um ataque terrorista. Isto, quando as técnicas estiverem muito mais rápidas e automatizadas, e a monitorização do microbioma possa ser constante e instantânea sem demorar os quase dois anos do estudo atual.

Os resultados deste estudo foram publicados na revista Cels 1 (http://www.cell.com/pb/assets/raw/journals/research/cell-systems/do-not-delete/CELS1_FINAL.pdf).

 

Tiago Magalhães

 

Video WSJ sobre o projeto
http://www.nasdaq.com/video/mapping-the-bacteria-in-the-nyc-subway-518636766


© 2015 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva


Tiago Magalhães

Veja outros artigos deste/a autor/a.
Escreva ao autor deste texto

Ficheiros para download Jornais que já efectuaram download deste artigo