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“Desqueimar” ossos

30 Nov 2015 - 14h11 - 4.159 caracteres

Cientistas portugueses lideram equipa internacional que utiliza método pioneiro para a caracterização de vítimas desconhecidas com base nos seus restos mortais queimados.

 

Investigadores da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) lideram uma equipa internacional que está a desenvolver um método, pioneiro a nível mundial, para resolver um dos grandes problemas dos cientistas forenses: a caraterização biológica rigorosa de vítimas desconhecidas com base nos seus restos mortais queimados, em situações complexas como acidentes de avião ou ataques terroristas.

Quando os ossos são queimados, «a sua estrutura e dimensão são alteradas, tornando difícil a tarefa de identificar sexo, idade e estatura», explica David Gonçalves, do Centro de Investigação em Antropologia da Saúde (CIAS), acrescentando que, «por exemplo, essas informações podem ser importantes para estabelecer a identificação positiva de uma vítima desconhecida.»

O especialista em ossos da UC sabe bem a dificuldade que estes casos levantam e, por isso, colocou o problema a Maria Paula Marques e Luís Batista de Carvalho, da Unidade de I&D “Química-Física Molecular”, que utilizam luz e feixes de partículas de alta energia para estudar estruturas biológicas a nível molecular.

A esta equipa juntaram-se mais três investigadores, dois deles do Reino Unido, tendo avançado para um método que usa feixes de neutrões para avaliar as mudanças ocorridas quando os ossos são submetidos a processos de queima.

As designadas técnicas de espectroscopia vibracional fornecem informação impossível de obter por outras vias: «com recurso a lasers, feixes de neutrões e radiação de infravermelho, conseguimos avaliar a estrutura submicroscópica do osso, ou seja, ver como compostos seus constituintes estão organizados, permitindo saber, por exemplo, quanto tempo esteve exposto a temperaturas elevadas, que tipo de explosivo foi usado, etc.», esclarecem Maria Paula Marques e Luís Batista de Carvalho.

Na prática, os investigadores pretendem obter um «fator de correção das dimensões alteradas por processos de queima, permitindo rapidamente encontrar as características e tamanho originais dos ossos». É como “desqueimar” o esqueleto.

As primeiras experiências realizadas com o feixe de neutrões do Laboratório de Investigação ISIS – Harwell Campus (Science & Technology Facilities Council, Reino Unido) em amostras de ossos humanos indicam que o método é promissor.

As amostras utilizadas são provenientes de ossadas não reclamadas que foram doadas à Coleção de Esqueletos Identificados do Século XXI alojada no Laboratório de Antropologia Forense da Universidade de Coimbra.

Se tudo correr como previsto, dentro de três a quatro anos, cientistas forenses e bioarqueólogos terão ao seu dispor «uma ferramenta fiável, rápida e de baixo custo para avaliar as mudanças ocorridas nos ossos queimados. O problema dos métodos métricos que usamos atualmente para construir o perfil biológico é o seu grau de fiabilidade, que é baixo», observa David Gonçalves.

Apesar de ainda ter muito trabalho pela frente, a equipa está confiante em obter um instrumento de correção pioneiro que terá um forte impacto em múltiplos cenários, «quer em contexto arqueológico quer em contexto forense, nomeadamente em situações de crime, terrorismo e acidente, entre outros.»

 

Cristina Pinto (Assessoria de Imprensa - Universidade de Coimbra)


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Cristina Pinto / Universidade de Coimbra

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