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Evolução de uma espécie também envolve as suas bactérias residentes

30 Set 2016 - 10h38 - 4.561 caracteres

Os animais vivem numa associação próxima com microorganismos, transportando bactérias benéficas ao mesmo tempo que combatem infecções patogénicas. Agora, uma equipa de investigação do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC) descobriu que as bactérias simbióticas desempenham um papel direto na evolução do seu hospedeiro, modulando a forma como este se adapta a organismos patogénicos. Este estudo vai ser publicado esta semana na revista científica PLoS Genetics.

Cada vez mais se torna claro que as bactérias que residem no corpo de animais desempenham importantes funções na vida do hospedeiro. As bactérias simbióticas podem influenciar o desenvolvimento, a fisiologia e o comportamento do hospedeiro, bem como aumentar a resistência do hospedeiro a agentes patogénicos. Mas até à data desconhecia-se a real contribuição da evolução das bactérias simbióticas na adaptação de animais a organismos patogénicos. Élio Sucena e Luís Teixeira, investigadores principais de dois laboratórios do IGC, juntaram as suas competências e abordaram este problema.

As experiências que realizaram envolveram moscas da fruta (Drosophila melanogaster) e a sua bactéria simbiótica, Wolbachia, expostas a infeções virais. “O nosso trabalho anterior tinha mostrado que a Wolbachia consegue proteger as moscas da fruta contra vírus, e que diferentes estirpes dessas bactérias conferem diferentes níveis de proteção. Assim, ao estudarmos moscas que transportam diferentes estirpes de Wolbachia pudemos investigar como é que a evolução ocorria tanto ao nível das bactérias como do hospedeiro”, explicam Vítor Faria e Nelson Martins, primeiros co-autores deste trabalho.

Ao compararem populações de moscas que evoluíram na presença de vírus com outras que evoluíram na sua ausência, os investigadores observaram diferenças significativas na sua composição bacteriana. Ao longo da evolução, as estirpes de Wolbachia que conferem maior proteção contra a infeção viral eram selecionadas e mantidas na população de moscas expostas ao vírus. As outras estirpes desapareceram da população de moscas. Estes resultados indicavam que a seleção de estirpes de Wolbachia estava associada à vantagem que conferiam ao hospedeiro: após a infeção, as moscas que transportavam as estirpes bacterianas mais protetoras eram capazes de sobreviver melhor e reproduzir-se mais do que as outras moscas.

“O hospedeiro e as suas bactérias simbióticas estão a agir como uma unidade em resposta à infecção patogénica, com a evolução de ambos os genomas a contribuir para a adaptação do hospedeiro. Acreditamos que resultados semelhantes vão ser observados com outras bactérias e animais”, diz Élio Sucena.

“O papel desempenhado pelas bactérias simbióticas na evolução do hospedeiro deve ser tido em consideração quando se abordam diferentes interações hospedeiro-patogéneos”, acrescenta Luís Teixeira.

Neste estudo, a equipa do IGC colaborou com Sara Magalhães do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (Ce3C), da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, e com Christian Schlötterer do Institut für Populationsgenetik (Áustria). Este trabalho foi financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia e pela Austrian Science Funds.

 

Referência do artigo: Faria VG, Martins NE, Paulo TF, Magalhães S, Nolte V, Schlötterer C, et al. (2016) Drosophila Adaptation to Viral Infection through Defensive Symbiont Evolution. PLoS Genet 12(9): e1006297. doi:10.1371/journal.pgen.1006297

 

Legenda da foto anexa: Trabalho laboratorial com moscas da fruta. Créditos: Sandra Ribeiro, IGC.

 

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Ana Mena (Instituto Gulbenkian de Ciência)

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