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Estudar o papel da competição na evolução dos organismos vale 2 milhões a investigadora portuguesa

01 Dez 2016 - 19h26 - 5.620 caracteres

A bióloga Sara Magalhães, investigadora no cE3c - Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais, vai receber uma Consolidator Grant do European Research Council (ERC) para estudar um problema fundamental em Ecologia e Evolução: como é que a competição entre organismos molda a evolução das espécies? É a primeira vez que uma ERC Consolidator Grant é atribuída em Ecologia e Evolução em Portugal, e vem para a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, onde Sara Magalhães é Professora Auxiliar.

 

“Como é que a competição entre organismos molda a evolução das espécies?"

A pergunta não é nova – foi Charles Darwin o primeiro a fazê-la, há mais de 150 anos, e foi também ele o primeiro a adiantar algumas respostas. No entanto o problema está longe de estar resolvido, e é aqui que entra o trabalho de Sara Magalhães. Para isso, desenhou um conjunto de experiências que utilizam duas espécies de ácaros herbívoros e tomateiros. Os resultados serão uma referência para compreender outros sistemas na Natureza.

 

Competir pode ser uma forma de fazer a casa

Seja entre plantas, animais ou bactérias, a competição é um dos principais motores do processo evolutivo. Os organismos podem competir por uma enorme variedade de recursos de que necessitam para viver: alimento, espaço ou parceiro sexual são alguns exemplos. Ao utilizarem um recurso que outro organismo também utiliza – ou seja, ao competirem –, os organismos não só diminuem a quantidade de recurso disponível como também podem alterá-lo para seu próprio benefício, transformando o ambiente que o rodeia. Em Ecologia dá-se a este processo o nome de construção do nicho.

 

Duas espécies de ácaros e um tomateiro (especial)

Durante os próximos 5 anos com o projeto "COMPCON - Competição sob construção do nicho" (Competition under niche construction), Sara Magalhães vai explorar um sistema biológico composto por duas espécies de ácaro-aranha, Tetranychus urticae e Tetranychus ludeni, que competem por um alimento - a planta do tomate.

Estes ácaros-aranha alteram as defesas da planta do tomate de formas opostas. Os ácaros T. urticae activam as defesas do tomateiro quando se alimentam, o que diminui a sua performance. Por outro lado, os ácaros T. ludeni provocam na planta uma reacção oposta, que lhes é favorável: em vez de a planta aumentar a produção das suas defesas, suprime-as, tornando a alimentação do ácaro mais fácil. Só que a alimentação torna-se também mais fácil para os ácaros competidores, os T. urticae.

O conjunto de experiências que Sara Magalhães vai desenvolver vai permitir perceber como é que esta alteração do ambiente condiciona a evolução destas duas espécies competidoras, ao longo de muitas gerações. Para isso, além de tomateiros normais, Sara Magalhães vai utilizar um tomateiro mutante, cujas defesas não são afetadas pela presença de nenhum dos ácaros – e onde, portanto, não pode haver construção de nicho: "Estudando a evolução dos competidores nos dois ambientes diferentes – plantas do tomate que respondem à presença de ácaros e plantas do tomate que não respondem – vamos poder desmontar o efeito de diferentes fatores da competição no processo evolutivo dos dois ácaros competidores", explica Sara Magalhães.

 

Financiamento para investigação fundamental

As ERC Consolidator Grants apoiam investigadores que demonstram um percurso científico de excelência permitindo-lhes consolidar a sua carreira científica e o seu grupo de investigação. O projeto COMPCON tem início previsto para maio de 2017, e será desenvolvido em colaboração com investigadores da Universidade de Montpellier (França).

Para além de prestigiante, a ERC é das poucas bolsas competitivas que apostam em projetos de risco e em investigação fundamental. “Com a ERC recebo de uma vez os onze projetos que a FCT me negou – mas num só”, declara Sara Magalhães. Apesar do projeto ser investigação fundamental, os ácaros utilizados nas experiências são uma conhecida praga agrícola, os tomateiros são uma planta de cultivo importante, e “perceber a forma como as duas espécies competem e como isso afeta a forma como evoluem pode vir a ser essencial para fazer gestão de pragas. É preciso perceber que se deixarmos de fazer investigação fundamental, em breve não haverá investigação aplicada, pois a segunda não vive sem a primeira," acrescenta a investigadora.

 

Gabinete de Comunicação do cE3c - Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais


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