Cafeína pode prevenir os problemas de “memória” associados à diabetes
Por: Catarina Amorim
Uma das complicações menos entendidas da diabetes é o efeito da doença no cérebro, onde causa problemas de memória, aprendizagem e pode aumentar mesmo o risco de demência, embora como isto acontece não é claro.
Um novo estudo em ratinhos com diabetes do tipo 2, realizado pelo investigador Rodrigo Cunha e colegas, do Centro de Neurociências e Biologia Celular da Universidade de Coimbra, identifica finalmente a degeneração cerebral causada pela doença que leva aos problemas de memória, e descobre que a cafeína pode proteger o cérebro contra este problema. Curiosamente, a neurodegeneração identificada no estudo é igualmente vista nos estádios iniciais de várias doenças neurodegenerativas que afetam a memória, sugerindo que a cafeína, ou compostos similares, poderão ajudar, não só na diabetes, mas também nestas enfermidades.
O estudo agora publicado na revista PLoS ONE usa um tipo de ratinhos descoberto há pouco tempo que desenvolve uma diabetes do tipo 2 muito semelhante à nossa – a doença aparece em adultos tal como connosco, e em resultado de uma dieta rica em gorduras (em humanos os fatores de risco desta variante da diabetes são obesidade, maus hábitos alimentares e falta de exercício). Cunha e colegas usam estes novos animais para tentar descobrir o que acontece no cérebro dos diabéticos, e investigar a possibilidade de a cafeína poder ter um efeito neuro-protetor (já que este estimulante tem sido associado a um efeito protetor sobre a memória noutras patologias).
Para isto os investigadores dividiram os animais em 4 grupos – ratinhos diabéticos consumindo ou não cafeína (equivalente a 8 chávenas de café por dia), e normais, igualmente com ou sem cafeína – e, após compará-los, descobriram que a cafeína não só protege contra a perda de memória, mas também previne a obesidade e os altos níveis de açúcar no sangue típicos da doença.
Quando o cérebro destes animais foi analisado descobriu-se que a perda de memória está ligada a uma degeneração do hipocampo - área do cérebro associada à aprendizagem e memória e que é frequentemente atrofiada em diabéticos embora o porquê não fosse conhecido. E também que a cafeína previne esta degeneração através da redução dos níveis de uma molécula chamada “recetor de adenosina A2AR”.
O fato deste tipo de degeneração ter sido já visto noutras patologias do cérebro que também afetam a memória – tal como as doenças de Alzheimer e Parkinson – sugere duas coisas extremamente interessantes: primeiro que o mecanismo que leva à perca de memória nas diferentes doenças neurodegenerativas parece ser um só (o que é extraordinário, considerando a variedade destas doenças), e segundo, que a cafeína, ou fármacos com mecanismos de ação semelhante, poderão ser usadas para proteger o cérebro também nestas patologias.
Mas significa isto então que devemos passar a beber oito chávenas de café por dia para evitar a perda de memória na velhice ou em diabetes?
“Não – explica Rodrigo Cunha - na verdade, a dose de cafeína que mostrou ser eficaz contra a doença é excessiva, embora um consumo moderado poderá sem dúvida ser benéfico. Mas o nosso objetivo é a criação de um fármaco mais potente e com menos efeitos colaterais do que a cafeína; estudos com animais permitem-nos identificar alvos potenciais - neste caso A2AR - para dai desenvolver medicamentos. Agora o próximo passo é testar derivados químicos da cafeína que atuem como antagonistas deste recetor, e ver quais são eficazes contra a encefalopatia diabética.”
Com a diabetes do tipo 2 a afetar já 346 milhões de pessoas - quase 5% da população mundial - e estando prevista atingir mais de meio bilhão até 2030 estes resultados, se puderem ser replicados em humanos, podem ser cruciais para conseguir proteger o cérebro de milhões de doentes.
Catarina Amorim
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