Podemos contar quantas estrelas vemos no céu?
Diz-se que as estrelas visíveis a olho nu são incontáveis. Há quem imagine que são milhões. No entanto, o número de estrelas visíveis sem ajuda óptica, mesmo em condições favoráveis, é relativamente modesto e muito abaixo do que dita o senso comum. Não acredita? Venha então participar nesta aventura.
Como fazer um conta-estrelas
Para saber o número aproximado de estrelas que podemos detectar a olho nu, do nosso local, não nos vamos pôr a contar, uma a uma, todas as estrelas visíveis. Isso seria tarefa de matar a paciência de qualquer pessoa. Felizmente há um caminho mais simples e rápido: basear a nossa contagem em amostras fáceis, contando o número de estrelas visíveis numa pequena extensão aparente do céu, bem delimitada. Deste modo, haverá poucas estrelas a contar em cada caso. Fazendo a média das várias contagens, realizadas em diferentes direcções do céu nocturno, poderemos calcular facilmente o número total (aproximado) de estrelas observáveis.
Para delimitar uma pequena parcela do céu, podemos utilizar um quadrado de cartolina preta, com cerca de 24 cm´24cm, recortando nele uma abertura circular com 72 mm de diâmetro, centrada no quadrado (Veja-se a figura). A abertura desenha-se com um compasso e depois recorta-se com uma tesoura. Prende-se um cordel fino a um ponto qualquer da cartolina, de modo que, com a linha esticada e a cartolina perpendicular à nossa linha de visão, a cartolina fique a uns 57 cm do olho. Nada mais simples.
A abertura circular, vista à distância referida, delimitará uma área correspondente a cerca de 1/1000 da área total aparente do céu, ou seja, a cerca de 1/500 do céu que num dado momento se encontra acima do horizonte. A justificação é simples: como estamos à superfície da Terra, só poderemos ver (num dado momento), metade da esfera celeste
À noite, estende-se o cordel conforme indicado e, procurando não mover a cartolina durante cada registo, contam-se as estrelas visíveis a olho nu dentro da abertura circular. Como vamos considerar uma parcela minúscula do céu, o número de estrelas observadas será pequeno e muito rápido de contar. Espere que os seus olhos se adaptem à obscuridade (cerca de 15 minutos), para ver mais estrelas.
Fazem-se pelo menos cinco contagens, em diferentes direcções variadas do céu. Depois faz-se a média dos números assim obtidos. Multiplicando essa média por 500, teremos o número aproximado de estrelas visíveis a olho nu, desse local. A questão do local é significativa porque, como se sabe, nos arredores de uma cidade não contaremos tantas estrelas como no campo.
Em vez do quadrado com abertura circular, também se pode utilizar um tubo de cartolina preta, enrolada de modo a ter 57 cm de comprimento e 72 mm de diâmetro. Na extremidade do tubo oposta ao céu deverá estar o olho do observador, bem centrado.
Fazer as contas
Como exemplo, imaginemos que uma pessoa obteve os números seguintes:
1.ª contagem: 4 estrelas;
2.ª contagem: 5;
3.ª contagem: 3;
4.ª contagem: 6.
5.ª contagem: 4;
6.ª contagem: 2.
A média destes números é 4,0. Portanto, o número de estrelas acima do horizonte será 500 vezes maior, ou seja, 4,0´500 = 2000. Isto corresponde a um local relativamente escuro. Numa aldeia remota obteremos números maiores. Junto às cidades, devido à poluição luminosa, não será surpresa que se vejam menos de 330 estrelas num dado momento.
O senso comum e a tradição popular são muito exagerados, mesmo no caso dos melhores locais de observação. Esta conclusão, embora inesperada, não faz perder a extraordinária beleza e encanto do céu nocturno. Agora, é a sua vez, caro leitor…
Texto e ilustrações de Guilherme de Almeida
Legenda da imagem - A cartolina usada para as contagens de estrelas (à esquerda), já recortada. À direita, o modo de utilizar a abertura circular nas contagens de estrelas.
Para saber mais, se quer conhecer o céu …
Guilherme de Almeida — "O Céu nas Pontas dos Dedos", Plátano Editora, Lisboa, 2013.
http://www.platanoeditora.pt/?q=C/BOOKSSHOW/7595
Guilherme de Almeida — "Roteiro do Céu", Plátano Editora, Lisboa, 5.ª Edição, 2010.
http://www.platanoeditora.pt/index.php?q=C/BOOKSSHOW/17
© 2013 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva
Guilherme de Almeida
Guilherme de Almeida (n. 1950) é licenciado em Física pela Faculdade de Ciências de Lisboa e foi professor desta disciplina, tendo incluído Astronomia na sua formação universitária. Proferiu mais de 80 de palestras sobre Astronomia, observações astronómicas e Física, publicou mais de 90 artigos e é formador certificado nestas matérias. Utiliza telescópios mas defende a primazia do conhecimento do céu a olho nu antes da utilização de instrumentos de observação. É autor de oito livros sobre Astronomia, observações astronómicas e Física. Algumas das suas obras também estão publicadas em inglês, castelhano e catalão. Mais informação em http://www.wook.pt/authors/detail/id/5235
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